Apesar de há muito estar a pedir um balázio na mona, Robert Mugabe tem algumas vezes razão. Hoje o governo do Zimbabué acusou Londres de estar a usar a epidemia de cólera - que já fez quase 600 mortos - para granjear apoios internacionais e invadir o país, com o objectivo de o derrubar. E tem razão.
Ainda anteontem aqui escrevi (Rice, George W. Bush e Mugabe - a ordem dos nomes é arbitrária): “Menos importante (do que a cólera), pelos vistos, é o facto de mais de quatro milhões de zimbabueanos terem fugido do país, fazendo do Zimbabué o maior exportador de refugiados.
Menos importante, pelos vistos, é o facto de a taxa de inflação ultrapassou os 231 milhões por cento anuais, ou o facto de a grande maioria dos estabelecimentos comerciais do país nada terem para vender, ou o facto de mais de cinco milhões de habitantes necessitarem de auxílio alimentar de emergência nos próximos meses”.
Na notícia, avançada pelo diário oficial The Sunday Mail, George Charamba, porta-voz de Mugabe, chama “louco” ao primeiro-ministro britânico, Gordon Brown.
O arcebispo de York apelou ao derrube de Mugabe no sábado, ao mesmo tempo que Brown instava a comunidade internacional à “união” contra o regime de Harare.
Mugabe culpa constantemente a comunidade internacional dos descalabros resultantes da sua política, sobretudo o Reino Unido.
O principal partido da oposição zimbabueana, o Movimento para a Mudança Democrática (MDC), de Morgan Tsvangirai - que em Março ganhou as legislativas e as presidenciais, contestadas por Mugabe -, classificou as acusações de Harare contra Brown de “alucinações”.
A epidemia de cólera que flagela o Zimbabué desde Agosto - segundo as Nações Unidas (ONU) - afecta 14.000 pessoas na capital e principais cidades do país, ameaçando toda a região.
A situação de calamidade em que se encontra o Zimbabué - governado por Mugabe desde 1980 - foi precipitada com uma reforma agrária encetada há uma década, com a expropriação dos proprietários rurais tradicionais. O resultado foi que a produção agrícola caiu a pique e a população passa fome.
A incapacidade de o executivo zimbabueano ter pulso no país foi também ressaltada pelo ex-secretário-geral da ONU, Kofi Annan, em Joanesburgo.
“É uma decepção”, lamentou hoje o dignitário ganês, que insistiu no imperativo de ser “acelerada a transição política” no Zimbabué com a ajuda da Comunidade para o Desenvolvimento da África Austral (SADC).
Annan, o antigo presidente norte-americano Jimmy Cárter e a militante moçambicana dos direitos humanos Graça Machel (mulher de Nelson Mandela) quiseram ir ao Zimbabué entre 22 e 23 de Novembro, mas viram os vistos de entrada recusados por Harare.
As três personalidades foram acusadas de “conspiração” por Mugabe.
A África do Sul envia amanhã uma missão ao Zimbabué para avaliar a situação sanitária e pediu uma reunião de emergência dos ministros da Saúde da SADC, na quinta-feira, em Joanesburgo.
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